quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

A relação ópio-CIA-Al Qaeda PARTE 2

Um dos principais objectivos da propaganda de guerra é "fabricar um inimigo". O "inimigo do exterior" personificado por Osama bin Laden está a "ameaçar a América".

É necessária uma guerra antecipativa (pre-emptive) contra os "terroristas islâmicos" para defender a mãe pátria. A realidade é virada de pernas para o ar. A América está a ser atacada.

Na sequência do 11 de Setembro, a criação deste "inimigo do exterior" tem servido para esconder os verdadeiros objectivos económicos e estratégicos por detrás da guerra no Médio Oriente e na Ásia Central. Justificada por razões de autodefesa, a guerra preventiva é publicitada como uma "guerra justa" com um imperativo humanitário.

Na altura em que aumenta o sentimento anti-guerra e que a legitimidade política da administração Bush vacila, é preciso dissipar as dúvidas quanto à existência deste falso "inimigo exterior".

O contra-terrorismo e a propaganda de guerra estão interligados. O aparelho de propaganda alimenta a desinformação nas cadeias noticiosas. Os alertas terroristas têm que parecer "genuínos". O objectivo é apresentar os grupos terroristas como "inimigos da América".

Ironicamente, a Al Qaeda – o "inimigo exterior da América" e alegado arquitecto do 11 de Setembro – é uma criação da CIA.

Desde o início da guerra sovieto-afegã no princípio dos anos 80, que o aparelho de informações dos EUA apoiou a formação das "brigadas islâmicas". A propaganda tem como objectivo apagar a história da Al Qaeda, abafar a verdade e "matar as testemunhas" sobre o modo como este "inimigo do exterior" foi fabricado e transformado no "Inimigo Número Um".

O aparelho de informações dos EUA criou as suas próprias organizações terroristas. E, simultaneamente, criou os seus alertas terroristas contra as organizações terroristas que ele próprio criou. Entretanto, foi implantado um coeso programa de contra-terrorismo no valor de milhares de milhões de dólares para "perseguir" essas organizações terroristas.

Retratado de forma estilizada pelos meios de comunicação ocidentais, Osama bin Laden, apoiado pelos seus diversos homens de confiança, constitui o papão pós guerra-fria da América, que "ameaça a democracia ocidental". A alegada ameaça dos "terroristas islâmicos" infiltra-se em toda a doutrina de segurança nacional dos EUA. O seu objectivo é justificar guerras de agressão no Médio Oriente, e ao mesmo tempo introduzir na América os contornos do Estado de Segurança da Nação.

Antecedentes Históricos

Quais são as origens históricas da Al Qaeda? Quem é Osama bin Laden?

O alegado cérebro por detrás dos ataques terroristas do 11 de Setembro, Osama bin Laden, de origem saudita, foi recrutado durante a guerra sovieto-afegã, "ironicamente sob os auspícios da CIA, para combater os invasores soviéticos" (Hugh Davies, "`Informers' point the finger at bin Laden; Washington on alert for suicide bombers." ['Informadores' apontam o dedo para bin Laden; Washington em alerta contra bombistas suicidas]. The Daily Telegraph, Londres, 24/Agosto/1998).

Em 1979 foi desencadeada no Afeganistão a maior operação secreta na história da CIA.

"Com o encorajamento activo da CIA e do ISI do Paquistão, que pretendiam transformar o Jihad afegão numa guerra global travada por todos os estados muçulmanos contra a União Soviética, juntaram-se à guerra do Afeganistão cerca de 35 000 radicais muçulmanos de 40 países islâmicos entre 1982 e 1992. Outras dezenas de milhares foram estudar nas madrassas paquistanesas. No total, houve mais de 100 000 radicais muçulmanos estrangeiros que foram influenciados directamente pela Jihad afegã". (Ahmed Rashid, "The Taliban: Exporting Extremism" [Os Taliban: exportação do extremismo], Foreign Affairs, Novembro-Dezembro 1999).

Este plano dos serviços secretos dos EUA foi efectuado com o apoio activo dos Inter Services Intelligence (ISI), do Paquistão, que foram encarregados de canalizar ajuda militar secreta e fundos para as brigadas islâmicas, em ligação com a CIA, as madrassas e campos de treino mujahideen.

O apoio do governo dos EUA aos mujahideens foi apresentado à opinião pública mundial como uma "resposta necessária" à invasão soviética do Afeganistão em 1979, em apoio ao governo pró-comunista de Babrak Kamal.

A operação militar secreta da CIA no Afeganistão, que consistiu na criação das "brigadas islâmicas", foi desencadeada antes, e não depois, da entrada de tropas soviéticas no Afeganistão. Na verdade, a intenção de Washington era desencadear deliberadamente uma guerra civil, que já dura há mais de 25 anos.

O papel da CIA no estabelecimento da fundação da Al Qaeda está confirmado numa entrevista de 1998 a Zbigniew Brzezinski que, na altura, era Conselheiro de Segurança Nacional do presidente Jimmy Carter.

Brzezinski: Segundo a versão oficial da história, a ajuda da CIA aos mujahideen começou em 1980, ou seja, depois de o exército soviético ter invadido o Afeganistão, em 24 de Dezembro de 1979. Mas, a realidade, guardada em segredo até hoje, é totalmente diferente. Com efeito, foi em 3 de Julho de 1979 que o presidente Carter assinou a primeira directiva para o apoio secreto aos opositores do regime pró-soviético de Cabul. E nesse mesmo dia, escrevi uma nota ao Presidente em que lhe explicava que, na minha opinião, este apoio iria provocar uma intervenção militar soviética.

Pergunta: Apesar desse risco, o senhor foi defensor dessa acção operação. Mas, provavelmente, o senhor também desejava essa entrada soviética na guerra e queria provocá-la?

Brzezinski: Não é bem assim. Não empurrámos os russos para intervir, mas obviamente aumentámos a probabilidade de eles o fazerem.

Pergunta: Quando os soviéticos justificaram a sua intervenção afirmando que pretendiam lutar contra um envolvimento secreto dos Estados Unidos no Afeganistão, as pessoas não acreditaram neles. No entanto, havia nisso uma base de verdade. Hoje não lamenta nada?

Brzezinski: Lamentar o quê? Essa operação secreta foi uma ideia excelente. Teve como efeito atrair os russos para a ratoeira afegã e quer que eu lamente? No dia em que os soviéticos atravessaram oficialmente a fronteira, escrevi ao presidente Carter: Temos agora a oportunidade de dar à URSS a sua Guerra do Vietname. Com efeito, Moscovo teve que travar, durante quase 10 anos, uma guerra insustentável para o governo, um conflito que provocou a desmoralização e por fim a dissolução do império soviético.

Pergunta: E também não lamenta ter apoiado o fundamentalismo islâmico, ao fornecer armas e conselho aos futuros terroristas?

Brzezinski: O que é que é mais importante na história mundial? Os Taliban ou o colapso do império soviético? Uns quantos muçulmanos provocadores ou a libertação da Europa central e o fim da Guerra-Fria? ("The CIA's Intervention in Afghanistan, Interview with Zbigniew Brzezinski, President Jimmy Carter's National Security Adviser" [A Intervenção da CIA no Afeganistão, Entrevista com Zbigniew Brzezinski, Conselheiro de Segurança Nacional do Presidente Jimmy Carter], Le Nouvel Observateur, Paris, 15-21/Janeiro/1998, publicada em inglês, em Centre for Research on Globalisation, http://www.globalresearch.ca/articles/BRZ110A.html , 05/Outubro/2001, itálicos nossos).

Confirmando o relato de Brzezinski, a CIA criou uma "Rede Islâmica Militante".

O "Jihad Islâmico" (ou guerra santa contra os soviéticos) passou a fazer parte integrante da estratégia dos serviços secretos da CIA. Foi apoiado pelos Estados Unidos e pela Arábia Saudita, e financiado significativamente através do tráfico de drogas do Crescente Dourado:

"Em Março de 1985, o presidente Reagan assinou a Directiva de Decisão de Segurança Nacional 166 … [que] autorizava o reforço do apoio militar secreto aos mujahideen, e que tornava claro que a guerra secreta afegã tinha um novo objectivo: derrotar as tropas soviéticas no Afeganistão através de acção secreta e estimular uma retirada soviética. A nova assistência secreta dos EU começou com um aumento dramático no fornecimento de armamento – um aumento regular até 65 000 toneladas por ano em 1987… assim como uma "torrente infindável" de especialistas da CIA e do Pentágono que viajaram até ao quartel-general secreto do ISI do Paquistão na estrada principal perto de Rawalpindi, no Paquistão. Aí, os especialistas da CIA reuniam com quadros dos serviços secretos paquistaneses para apoiar planos de operações para os rebeldes afegãos". (Steve Coll, The Washington Post, 19 de Julho, 1992).

A CIA, utilizando o ISI do Paquistão como intermediário, desempenhou um papel essencial no treino dos mujahideen. Por sua vez, os ensinamentos do Islão foram integrados no treino de guerrilha patrocinado pela CIA. Foram fundamentalistas Wahabi, financiados pela Arábia Saudita, que fundaram as madrassas: "Foi o governo dos Estados Unidos que apoiou o ditador paquistanês, general Zia-ul Haq, na criação de milhares de escolas religiosas, de onde surgiram os germes dos Taliban". (Revolutionary Association of the Women of Afghanistan (RAWA), "RAWA Statement on the Terrorist Attacks in the U.S.", Centre for Research on Globalisation (CRG), http://globalresearch.ca/articles/RAW109A.html , 16 de Setembro 2001)

Os temas predominantes eram que o Islão era uma ideologia socio-política perfeita, que o sagrado Islão estava a ser violentado pelas tropas soviéticas ateias, e que o povo islâmico do Afeganistão devia reafirmar a sua independência derrubando o regime afegão esquerdista apoiado por Moscovo. (Dilip Hiro, Fallout from the Afghan Jihad [Dilip Hiro, Disseminação do Jihad afegão], Inter Press Services, 21 de Novembro, 1995).

O ISI do Paquistão utilizado como "intermediário"

O apoio secreto da CIA ao "Jihad Islâmico", era prestado indirectamente por intermédio do ISI paquistanês – i.e., a CIA não canalizava o seu apoio directamente para os mujahideen. Para que estas operações secretas tivessem "êxito", Washington tinha o cuidado de não revelar o objectivo supremo do "Jihad", que consistia não apenas em desestabilizar o governo laico (pró-soviético) do Afeganistão, mas também em destruir a União Soviética.

Nas palavras de Milton Beardman da CIA, "Nunca treinámos árabes". Mas, segundo Abdel Monam Saidali, do Centro Al-aram do Cairo para Estudos Estratégicos, bin Laden e os "árabes afegãos" receberam "diversos tipos de treino muito sofisticados que lhes foram concedidos pela CIA". (National Public Radio, Weekend Sunday (NPR) com Eric Weiner e Ted Clark, 16 de Agosto, 1998).

A este respeito, Beardman, da CIA, confirmou que Osama bin Laden não tinha conhecimento do papel que estava a desempenhar no interesse de Washington. Segundo bin Laden (citado por Beardman): "Nem eu, nem os meus irmãos, vimos indícios de apoio americano". (National Public Radio, Weekend Sunday (NPR) com Eric Weiner e Ted Clark, transcrição, 16 de Agosto, 1998).

Motivados pelo nacionalismo e fervor religioso, os guerrilheiros islâmicos não tinham consciência de que estavam a lutar contra o exército soviético por conta do Tio Sam. Embora houvesse contactos a níveis superiores da hierarquia das informações, os chefes dos rebeldes islâmicos no teatro de guerra não tinham contacto nem com Washington nem com a CIA.

Com o apoio da CIA e a canalização de quantidades maciças de apoio militar dos EUA, o ISI paquistanês transformou-se numa "estrutura paralela ao governo, de enorme poder em todos os aspectos. (Dipankar Banerjee, "Possible Connection of ISI With Drug Industry" [Possível Ligação do ISI à Indústria da Droga], India Abroad, 2 de Dezembro, 1994) O ISI tinha um corpo de funcionários de informações e militares, burocratas, agentes secretos e informadores, calculado em 150 mil pessoas. (ibid)

Entretanto, as operações da CIA também reforçaram o regime militar paquistanês liderado pelo general Zia Ul Haq:

"As relações entre a CIA e o ISI tornaram-se cada vez mais calorosas na sequência do golpe do [general] Zia que expulsou Bhutto e da instituição do regime militar … Durante a maior parte da guerra afegã, o Paquistão foi mais agressivamente anti-soviético do que os próprios Estados Unidos. Logo depois de as tropas soviéticas terem invadido o Afeganistão em 1980, Zia [ul Haq] enviou o chefe do ISI para desestabilizar os estados soviéticos da Ásia central. A CIA só concordou com este plano em Outubro de 1984.

A CIA era mais cautelosa do que os paquistaneses. Tanto o Paquistão como os Estados Unidos assumiram uma atitude de mistificação no Afeganistão com uma postura pública de negociarem um acordo, enquanto secretamente acordavam que a escalada militar era o melhor percurso". (Diego Cordovez e Selig Harrison, "Out of Afghanistan: The Inside Story of the Soviet Withdrawal" [Saída do Afeganistão: a História da Retirada Soviética], Oxford University Press, New York, 1995. Ver também a análise de Cordovez e Harrison em International Press Services, 22 de Agosto, 1995).

A CIA patrocinou o tráfico de narcóticos

A história do tráfico de drogas na Ásia Central está intimamente ligada às operações secretas da CIA. Antes da guerra sovieto-afegã, a produção do ópio no Afeganistão e no Paquistão ia directamente para os pequenos mercados regionais. Não havia produção local de heroína. (Alfred McCoy, "Drug Fallout: the CIA's Forty Year Complicity in the Narcotics Trade" [Disseminação da Droga: Quarenta Anos de Cumplicidade da CIA], The Progressive, 1 de Agosto, 1997)

O estudo do investigador Alfred McCoy confirma que, dois anos depois do assalto da operação CIA no Afeganistão, "as áreas fronteiriças entre o Paquistão e o Afeganistão tinham-se tornado no maior produtor mundial de heroína, fornecendo 60 por cento da procura dos EUA". (ibidem)

"Eram de novo homens de mão da CIA quem controlava este comércio de heroína. Quando os guerrilheiros mujahideen conquistavam território no interior do Afeganistão, ordenavam aos camponeses que plantassem ópio como tarefa revolucionária. Do outro lado da fronteira no Paquistão, líderes afegãos e organizações locais, sob a protecção dos serviços secretos paquistaneses, dirigiam centenas de laboratórios de heroína. Durante esta década de tráfico de droga totalmente aberto, a Agência de Combate à Droga dos EUA em Islamabad não se preocupou em fazer apreensões de vulto ou detenções… (ibidem)

O Afeganistão é um eixo estratégico na Ásia Central, junto à fronteira ocidental da China e à antiga União Soviética. Formando uma ponte terrestre, entre os corredores das condutas de petróleo e de gás, que liga a bacia do Mar Cáspio ao Mar Arábico, é também estratégico pela sua produção de ópio que actualmente, segundo fontes da ONU, fornece mais de 90% do mercado mundial de heroína, representando receitas de muitos milhares de milhões de dólares para as organizações envolvidas no negócio, instituições financeiras, agências de informações e crime organizado. (Ver "America's War on Terrorism" [Guerra da América contra o Terrorismo], de Michel Chossudovsky, Global Research, 2005, Capítulo XVI).

Com a protecção da CIA, deu-se uma nova explosão na produção de ópio na era pós guerra-fria. Desde a invasão do Afeganistão pelos EUA em Outubro de 2001, a produção de ópio aumentou 33 vezes mais desde a invasão liderada pelos EUA. A estimativa dos lucros anuais provenientes do tráfico de droga do Crescente Dourado aponta para 120 a 194 mil milhões de dólares (2006), representando mais de um terço do movimento de vendas anual mundial do tráfico de narcóticos. (Michel Chossudovsky, "Heroin is good for Your Health, Occupation Forces Support Afghan Drug Trade" [A Heroína é boa para a saúde, forças de ocupação apoiam o tráfico de droga afegão], Global Research, Abril de 2007. Ver também Douglas Keh, "Drug Money in a Changing World" [Dinheiro da droga num mundo em mudança], Technical document No. 4, 1998).

Da guerra sovieto-afegã à "guerra contra o terrorismo"

Apesar do desmantelamento da União Soviética, o extenso aparelho militar e de inteligência do Paquistão (o ISI) não foi desmantelado. Na sequência da Guerra-Fria, a CIA continuou a apoiar as brigadas islâmicas a partir do Paquistão. Foram desencadeadas novas iniciativas secretas no Médio Oriente, na Ásia Central, nos Balcãs e no sul da Ásia Oriental. No seguimento imediato da Guerra-Fria, o ISI do Paquistão "serviu como catalisador para a desintegração da União Soviética e o nascimento de seis novas repúblicas muçulmanas na Ásia central". (International Press Services, 22/Agosto/1995).

Entretanto, missionários islâmicos da seita Wahabi da Arábia Saudita, instalaram-se nas repúblicas muçulmanas, assim como no interior da federação russa, invadindo as instituições estatais laicas. Apesar da sua ideologia anti-americana, o fundamentalismo islâmico estava a servir, e bem, os interesses estratégicos de Washington na antiga União Soviética, nos Balcãs e no Médio Oriente.

Depois da retirada das tropas soviéticas em 1989, a guerra civil no Afeganistão continuou sem tréguas. Os Taliban estavam a ser apoiados pelos Deobandis paquistaneses e pelo seu partido político, o Jamiat-ul-Ulema-e-Islam (JUI). Em 1993, o JUI entrou na coligação governamental do Paquistão do primeiro-ministro Benazzir Bhutto. Estabeleceram-se laços entre o JUI, o exército e o ISI. Em 1996, com a queda do governo de Hezb-I-Islami Hektmatyar em Cabul, os Taliban não só instauraram um governo islâmico ditatorial, como "entregaram o controlo dos campos de treino no Afeganistão às facções JUI…". (Ahmed Rashid, "The Taliban: Exporting Extremism" "Os Taliban: exportação do extremismo], Foreign Affairs, Novembro - Dezembro, 1999, p. 22.)

O JUI, com o apoio do movimento saudita Wahabi, desempenhou um papel essencial no recrutamento de voluntários para lutar nos Balcãs e na antiga União Soviética. (ibidem)

Jane Defence Weekly confirma que "metade dos homens e equipamentos dos Taliban eram de origem paquistanesa proveniente do ISI". De facto, viria a saber-se que, depois da retirada dos soviéticos, ambos os lados da guerra civil afegã continuaram a receber apoio secreto dos EUA através do ISI paquistanês. (Tim McGirk, "Kabul Learns to Live with its Bearded Conquerors" [Cabul aprende a conviver com os seus conquistadores barbudos], The Independent, London, 06/Novembro/1996.)

Com o apoio dos serviços secretos militares do Paquistão, que por sua vez eram controladas pela CIA, o estado islâmico Taliban servia enormemente os interesses geopolíticos dos EUA. Sem dúvida é isto que explica porque é que Washington fechou os olhos ao reino de terror imposto pelos Taliban em 1996, incluindo a escandalosa abolição dos direitos da mulher, o encerramento das escolas para raparigas, a despedida de mulheres empregadas em lugares governamentais e a aplicação coerciva das "leis de punição Sharia". (K. Subrahmanyam, "Pakistan is Pursuing Asian Goals" [O Paquistão e os seus objectivos asiáticos], India Abroad, 03/Novembro/1995.)

O tráfico de drogas do Crescente Dourado continuou também a ser utilizado para financiar e equipar o Exército Muçulmano Bósnio (a começar no início dos anos 90) e o Exército de Libertação do Kosovo (ELK). De facto, na altura dos ataques de 11 de Setembro, havia mercenários mujahideen patrocinados pela CIA a lutar nas fileiras dos terroristas ELK-ELN nas suas incursões na Macedônia.

O estímulo aos movimentos separatistas na Índia

Paralelamente às operações secretas nos Balcãs e na antiga União Soviética, o ISI do Paquistão tem dado apoio, desde os anos 80, a diversas rebeliões separatistas islâmicas em Caxemira, na Índia.

Embora oficialmente condenadas por Washington, estas operações secretas do ISI foram levadas a efeito com a aprovação tácita do governo dos EUA. Coincidindo com o Acordo de Paz de Genebra de 1989 e com a retirada soviética do Afeganistão, o ISI foi essencial na criação do movimento militante Jammu e Kashmir Hizbul Mujahideen (JKHM). (Ver K. Subrahmanyam, "Pakistan is Pursuing Asian Goals" [O Paquistão e os seus objectivos asiáticos], India Abroad, 03/Novembro/1995).

Logo a seguir ao 11 de Setembro, os ataques terroristas de Dezembro de 2001 ao Parlamento Indiano – que contribuíram para pôr a Índia e o Paquistão em pé de guerra – foram liderados por dois grupos rebeldes com base no Paquistão, Lashkar-e-Taiba, (Exército dos Puros) e Jaish-e-Muhammad (Exército de Maomé), ambos secretamente apoiados pelo ISI do Paquistão. (Conselho de Relações Estrangeiras, "Terrorism: Questions and Answers, Harakat ul-Mujahideen, Lashkar-e-Taiba, Jaish-e-Muhammad" [Terrorismo: perguntas e respostas,, Harakat ul-Mujahideen, Lashkar-e-Taiba, Jaish-e-Muhammad] http://www.terrorismanswers.com/groups/harakat2.html , Washington 2002. Nota: Este relatório deixou de estar disponível no sítio web do CFR)

O oportuno ataque ao Parlamento Indiano, seguido de motins étnicos no Gujarat no início de 2002, foram o culminar de um processo iniciado nos anos 80, financiado por dinheiro da droga e com a cumplicidade das informações militares do Paquistão.

Não é necessário dizer, mas estes ataques terroristas apoiados pelo ISI serviram os interesses geopolíticos dos EUA. O poderoso Council on Foreign Relations (CFR) que desempenha um papel de bastidores na formulação da política externa dos EUA, confirma que os grupos rebeldes Lashkar e Jaish são apoiados pelo ISI:

Através do ISI, o Paquistão forneceu fundos, armas, instalações de treino, e ajuda para atravessar as fronteiras para Lashkar e Jaish. Este apoio – uma tentativa para repetir em Caxemira a "guerra santa" das brigadas islâmicas internacionais contra a União Soviética no Afeganistão – ajudou a introduzir o Islão radical no já longo conflito sobre o destino de Caxemira…

Esses grupos recebiam fundos de outras origens para além do governo do Paquistão?
Sim. Membros das comunidades paquistanesas e de Caxemira em Inglaterra enviaram milhões de dólares por ano, e os simpatizantes Wahabi do Golfo Pérsico também prestaram ajuda.

Os terroristas islâmicos em Caxemira têm ligações à Al Qaeda?

Sim. Em 1998, o líder de Harakat, Farooq Kashmiri Khalil, assinou a declaração de Osama bin Laden apelando a ataques contra americanos, incluindo civis, e seus aliados. Também se suspeita que bin Laden tenha financiado Jaish, segundo funcionários americanos e indianos. E Maulana Massoud Azhar, que fundou o Jaish, foi ao Afeganistão várias vezes, para se encontrar com bin Laden.

Onde foram treinados esses militantes islâmicos?
Muitos deles receberam treino ideológico nas mesmas madrassas, ou seminários muçulmanos, que ensinaram os Taliban e os combatentes estrangeiros no Afeganistão. Receberam treino militar em campos no Afeganistão ou em aldeias na parte de Caxemira controlada pelo Paquistão. Grupos extremistas abriram recentemente várias madrassas novas em Azad Caxemira.

(Council on Foreign Relations, "Terrorism: Questions and Answers, Harakat ul-Mujahideen, Lashkar-e-Taiba, Jaish-e-Muhammad", http://www.terrorismanswers.com/groups/harakat2.html Washington, 2002. Este texto foi retirado do sítio web do CFR em 2006)

O que o Council on Foreign Relations se esquece de reconhecer são as ligações entre o ISI e a CIA e o facto de que as "brigadas islâmicas internacionais" foram uma criação da CIA.

Insurreições na China patrocinadas pelos EUA

Significativo para a compreensão da "Guerra contra o Terrorismo" da América é a existência de insurreições islâmicas, apoiadas pelo ISI, na fronteira ocidental da China com o Afeganistão e o Paquistão, De facto, vários dos movimentos islâmicos nas repúblicas muçulmanas da antiga União Soviética estão integrados nos movimentos do Turquestão e de Uigur na região autónoma da China Xinjiang-Uigur.

Estes grupos separatistas – que incluem a Força Terrorista do Turquestão Oriental, o Partido Islâmico Reformista, a Aliança de Unidade Nacional do Turquestão Oriental, a Organização de Libertação Uigur e o Partido Jihad Uigur da Ásia Central – receberam, todos eles, apoio e treino da Al Qaeda de Osama bin Laden. (Segundo fontes oficiais chinesas citadas pela UPI, 20/Novembro/2001). O objectivo declarado destas insurreições islâmicas com base na China é o "estabelecimento dum califado islâmico na região". (Defence and Security, 30/Maio/2001).

O califado deverá integrar o Uzbequistão, o Tajiquistão, o Quirguistão (Turquestão ocidental) e a região autónoma de Uigur, da China (Turquestão ocidental) numa única entidade política.

O "projecto do califado" colide com a soberania territorial da China. Apoiado pelas diversas "fundações" Wahabi dos estados do Golfo, o separatismo na fronteira ocidental da China é, mais uma vez, consistente com os interesses estratégicos dos EUA na Ásia Central. Entretanto, um poderoso grupo de pressão localizado nos EUA está a canalizar apoios às forças separatistas do Tibete.

Promovendo tacitamente a secessão da região de Xinjiang-Uigur (usando o ISI do Paquistão como "intermediário"), Washington está a tentar desencadear um processo mais alargado de desestabilização política e de fractura da República Popular da China. Para além destas diversas operações secretas, os EUA instalaram bases militares no Afeganistão e em várias das antigas repúblicas soviéticas, directamente na fronteira ocidental da China.

A militarização do sul do Mar da China e do Estreito de Taiwan faz também parte integrante desta estratégia.

A agenda secreta de Washington

A política externa dos EUA não está interessada em deter a maré dos fundamentalistas islâmicos. De facto, passa-se exactamente o contrário. O significativo desenvolvimento do "Islão radical", a seguir à guerra-fria, na antiga União Soviética e no Médio Oriente está de acordo com a agenda secreta de Washington. Esta consiste mais em suster do que em combater os terroristas internacionais, com o objectivo de desestabilizar sociedades nacionais e de impedir a articulação de movimentos sociais laicos genuínos dirigidos contra o Império Americano.

Washington continua a apoiar – através das operações secretas da CIA – o desenvolvimento do fundamentalismo islâmico, em todo o Médio Oriente, na antiga União Soviética assim como na Índia e na China.

Por todo o mundo em desenvolvimento, o aumento de organizações sectárias, fundamentalistas e outras que tais, tende a servir os interesses dos EUA. Estas diversas organizações e rebeldes armados têm vindo a desenvolver-se, principalmente nos países em que as instituições de estado entraram em queda sob o peso das reformas económicas patrocinadas pelo FMI.

Estas organizações fundamentalistas contribuem para a destruição e expulsão das instituições laicas.

O fundamentalismo islâmico cria divisões sociais e étnicas. Mina a capacidade das pessoas para se organizarem contra o Império Americano. Estas organizações ou movimentos, como os dos Taliban, fomentam quase sempre a "oposição ao Tio Sam" dum modo que não constitui qualquer ameaça real para os interesses geopolíticos e económicos mais latos da América.

Apagar a história da Al Qaeda

Desde Setembro de 2001 que esta história da Al Qaeda tem sido amplamente apagada. As ligações das sucessivas administrações dos EUA à "rede terrorista islâmica" raras vezes são referidas.

Em Outubro de 2001, um governo que tinha andado a acoitar o terrorismo internacional, ao sabor da sua agenda de política externa, desencadeou uma guerra enorme no Médio Oriente e na Ásia Central, supostamente "contra o terrorismo internacional". Por outras palavras, a principal justificação para a guerra do Afeganistão e do Iraque foi totalmente fabricada. O povo americano foi deliberada e conscientemente enganado pelo seu governo.

Esta decisão de mistificar o povo americano foi tomada a 11 de Setembro de 2001, poucas horas depois dos ataques terroristas ao World Trade Centre. Sem quaisquer provas, Osama já estava escolhido como "principal suspeito". Dois dias depois, na quinta-feira, 13 de Setembro – ainda a investigação do FBI mal começara – o presidente Bush prometeu "levar o mundo à vitória".

Embora a CIA reconheça tacitamente que a Al Qaeda era um "trunfo das informações" durante a Guerra-Fria, afirmou-se que essas relações já "remontavam" a uma época passada. A maior parte dos relatórios pós 11 de Setembro tendem a considerar que essas ligações Al Qaeda-CIA pertenciam a uma "época passada" da guerra sovieto-afegã. São invariavelmente consideradas como irrelevantes para a compreensão do 11 de Setembro e da "Guerra Global contra o Terrorismo". Mas, poucos meses antes do 11 de Setembro, havia indícios de activa colaboração entre membros das forças militares americanas e de operacionais da Al Qaeda na guerra civil da Macedónia.

Perdido na barragem feita à história recente, os meios de comunicação ocidentais ignoram despreocupadamente ou desvalorizam o papel da CIA no apoio e no desenvolvimento de organizações terroristas internacionais durante a Guerra-Fria e depois dela

Um exemplo gritante da distorção dos meios de comunicação após o 11 de Setembro é a tese do "ricochete": diz-se que os "trunfos das informações se viraram contra os seus patronos; que criámos explosões na nossa própria cara". Numa exibição de lógica distorcida, a administração dos EUA e a CIA são apresentados como as infelizes vítimas:

"Os sofisticados métodos ensinados aos mujahideen, e os milhares de toneladas de armas que lhes foram fornecidas pelos EUA – e Grã-Bretanha – estão agora a afligir o ocidente no fenómeno conhecido como "ricochete", em que uma estratégia política recai sobre os próprios estrategas". ( The Guardian, Londres, 15/Setembro/2001)

Os meios de comunicação americanos, apesar de tudo, reconhecem que "a tomada de poder pelos Taliban [em 1996] é em parte o resultado do apoio dos EUA aos mujahideen – o grupo radical islâmico – nos anos 80 na guerra contra a União Soviética". Mas pouco ligam às suas afirmações factuais e concluem, em coro, que a CIA foi enganada por um Osama desonesto. É como "um filho que se vira contra o seu pai".

Depoimentos no Congresso sobre ligações ELK-Al Qaeda

Nos meados dos anos 90, a CIA e os Serviços Secretos da Alemanha, o BND, deram as mãos para apoiar secretamente o Exército de Libertação do Kosovo (ELK). Por sua vez, este recebia apoio da Al Qaeda.

Segundo Frank Ciluffo do Programa de Crime Global Organizado, num depoimento em Dezembro de 2000 na Comissão Judicial da Casa de Representantes:

"O que foi largamente escondido do público foi o facto de que o ELK recebia parte dos seus fundos da venda de narcóticos. A Albânia e o Kosovo estão no centro da "Rota dos Balcãs" que liga o "Crescente Dourado" do Afeganistão e do Paquistão aos mercados de droga da Europa. Esta rota vale cerca de 400 mil milhões de dólares por ano e o tráfico 80 por cento da heroína destinada à Europa". (Congresso dos EU, Depoimento de Frank J. Ciluffo, Vice-Director do Programa de Crime Global Organizado, perante a Comissão Judicial da Casa de Representantes, Washington DC, 13/Dezembro/2000).

Segundo Ralf Mutschke da divisão de Informações Criminais da Interpol, também num depoimento à Comissão Judicial da Casa de Representantes:

"O Departamento de Estado americano listou o ELK como uma organização terrorista, indicando que esta financiava as suas operações com dinheiro do tráfico internacional de heroína e com empréstimos concedidos por países e indivíduos islâmicos, entre os quais alegadamente Usama bin Laden. Outro elo com bin Laden é o facto de que o irmão dum líder numa organização Jihad egípcia e também comandante militar de Usama bin Laden, esteve a chefiar uma unidade de elite do ELK durante o conflito do Kosovo". (Congresso dos EU, Depoimento de Ralf Mutschke, da divisão de Informações Criminais da Interpol, perante a Comissão Judicial da Casa de Representantes, Washington DC, 13/Dezembro/2000).

Madeleine Albright cobiça o ELK

Estas ligações do ELK ao terrorismo internacional e ao crime organizado documentadas pelo Congresso dos EUA foram totalmente ignoradas pela administração Clinton. Na verdade, nos meses anteriores ao bombardeamento da Jugoslávia, a secretária de Estado Madeleine Albright andava atarefada a montar uma "legitimidade política" para o ELK. O exército paramilitar tinha sido elevado – de um dia para o outro – à posição de força "democrática" bona fide no Kosovo. Por seu turno, Madeleine Albright forçou o ritmo da diplomacia internacional: o ELK foi o ponta de lança no desempenho de um papel central nas falhadas "negociações de paz" em Rambouillet no início de 1999.

O Senado e a Casa de Representantes sancionam tacitamente o Terrorismo de Estado

Embora os diversos relatórios do Congresso americano confirmassem que o governo dos EUA tinha andado a trabalhar de braço dado com a Al Qaeda de Osama bin Laden, isso não impediu a administração Clinton, e a seguir a administração Bush, de armar e equipar o ELK. Os documentos do Congresso também confirmam que membros do Senado e da Câmara tinham conhecimento das relações da administração com o terrorismo internacional. Citando a declaração do Rep. John Kasich da Comissão dos Serviços Armados da Câmara: "Entrámos em ligação [em 1998-1999] com o ELK, que era o ponto de apoio de bin Laden…" (Congresso dos EUA, Transcrição da Comissão dos Serviços Armados da Câmara, Washington DC, 05/Outubro/1999).

No seguimento dos trágicos acontecimentos de 11 de Setembro, Republicanos e Democratas em uníssono deram todo o seu apoio ao Presidente para "declarar guerra a Osama".

Em 1999, o senador Jo Lieberman afirmava autoritariamente que "Lutar pelo ELK é lutar pelos direitos humanos e pelos valores americanos". Nas horas que se seguiram aos ataques de mísseis ao Afeganistão, em 7 de Outubro, o mesmo Jo Lieberman exigiu ataques aéreos punitivos contra o Iraque: "Estamos perante uma guerra contra o terrorismo… Não podemos fazer parar bin Laden e os Taliban". No entanto, o senador Jo Lieberman, enquanto membro da Comissão dos Serviços Armados do Senado tinha acesso a todos os documentos do Congresso relativos às ligações "ELK-Osama". Quando fez esta afirmação, sabia muito bem que aquelas organizações do governo americano assim como a NATO, estavam a apoiar o terrorismo internacional.

continua...

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